12 setembro, 2010

Confronto

Se existe algo que realmente me encanta em todo o mundo, isso é o que chamo de cultura. É estranho falar cultura hoje em dia sem que haja um buraco imenso em sua frente, perigoso e encantador - o senso comum. Esse, cheio de resquícios, ao que parece, imperceptíveis, de pensamento já sujo e gasto que frequenta todos os espaços, sejam os corredores, os bares, os dias.

Pensar como quem rumina é muito comum, especialmente entre aqueles que conseguem citar meia dúzia de frases - seja de quem for - e já se considera intelectual. É isso, temos intelectuais por todos os lados! E temos tanta gente também. O respirar dessa gente, pra mim, traz a poeira de tudo que vivemos sem ter vivido ou o atavismo dessas reações que temos. O que me interessa, no entanto, é o que dizem a cerca desse povo mesmo, que até onde enxergo, sou eu também.

Li há pouco algo sobre como a cultura de nós mesmo era pobre e era pobre por simplesmente se fechar em si. Não consigo me lembrar se li o post até o fim, mas identifico ali aquele pensamento que já deveria estar jogado num canto, mergulhado na cervaja de nossa comemoração da festa que ainda se faz presente em silêncio e hálito. O que não compreendo nessas afirmações de que somos passado e que, para crescer, é preciso mudar, ser diferente ou integrar o outro e sua 'cultura' é: o que, afinal de contas, se passa diante dos olhos e que chega à boca desses seres?

Certa vez, li que cultura é o confrotamento do ser com o seu real e no mometo, não consegui imaginar algo mais claro para a descrição da palavra. O confrontamento com o real mostra pra mim mais que uma esperada renovação diária, mais que um diálogo de mentes e corpos, mostra o  "evoluímos", como em uma escola de samba que mostra o seu início, meio e, para nossa sorte, o não fim das coisas. É o conjunto de tudo que faz com que nos portemos da maneira como somos. Da maneira certa, digo, da maneira como haveria de ser, como aprendemos e não como o outro se comportaria. Não há a cultura fechada. Temo que dizer isso seja perigoso, mas acredito que nem mesmo a última das tribos isoladas se mostrará sem qualquer coisa quem venha do outro. Pensar assim, de princípio, é pensar o mundo pequeno e todo em contato. No entanto, não é isso mesmo o que engrandece o mundo inteiro em sua diversidade impensável?

O que li dizia sobre a cutura em Salvador ser fechada, como auto-suficiente, como se cada coisa que fosse exaltada pelas mídias - ou tudo que isso possa representar - fosse o suficiente para decretar o que é pobre ou rico ou cultura de fato. Para mim, o que há é uma diferença grande entre isso que dizem e os modelos que tentam se impor de todas as maneiras. É o modelo da aceitação indiscriminada o que vejo.
Mas o confrontamento com o real não nos permitiria o comportamento tão almejado pelas elites baianas e brasileiras e feirenses  e de todos os cantos. Nos comportamos do jeito que dá - espero que me entendam quando digo isso. Por isso o pagode com a mão no chão, por isso as sessões de jazz no MAM, por isso os encontros todos em todas as universidades. O que há em todos esses cantos é o diálogo do que somos com as propostas de nos transformarmos.

Estamos mesmo é com os instrumentos errados: o pagode usa o interesse midiático de satirizar o gueto para ganhar o dinheiro que merece, e ambos ganham! Soubessem desse mecanismo por inteiro, o usariam de forma diferente. Os que fumam o jazz do MAM, pudessem eles perceber as arrumações malucas que a música traz e como ela, a música, nos dar uma lição de entrelaçamento cultural, transformação e gente, talvez soubesse o que estão ouvindo ali de verdade. E se todos os encontros nas universidades servissem para pensar e não reproduzir...

Todos talvez saíbam disso tudo. E é isso que aflinge: sabemos. Temos é medo de encarar.

Não. Então, não precisamos de nada, enfim. Nenhuma mudança de comportamento ou de atrações novas, ou espetáculos mais caros e respeitáveis. Não temos que respeitar nada. A movimentação inerente de nós mesmo para o daqui a pouco se encarrega de tornar-nos naquilo que seremos. A renovação, a modernidade eterna, traz o que somos e isso é cultura.

O que nos falta é a intencionalidade, os instrumentos estão aí para todos, afinal, caneta serve para escrever, mas encravada na jugular, mata! - como já disse o professor Elói. 

Não, não penso contra as coisas que nos chegam, penso é sobre como elas chegam. Não penso sobre a transformação. Tenho medo é da suplantação.

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